Até o fim do século 20
Sobre a democracia dos gregos
A maior parte da literatura da época antiga disponível, ou é contrária à democracia (Platão), ou não é grande entusiasta do regime de Péricles (Aristóteles). Essas duas abordagens, infelizmente, sulcaram o caminho por onde escorreram quase todas as versões posteriores, que raramente deram conta de captar o meme democrático original. Na ausência de qualquer texto autoral de Péricles, é necessário estudar a sua vida. As fontes são pouquíssimas: “A guerra dos peloponesos” de Tucídides, a “Vida de Péricles” (nas “Vidas paralelas”) de Plutarco, além, é claro de “A constituição de Atenas” de Aristóteles (ou a ele atribuída). Dos antigos, temos ainda apenas algumas referências feitas pelos poetas cômicos, “A República dos atenienses” (atribuída a Xenofonte ou a um suposto “Velho Oligarca”) – que não faz referência a Péricles, mas contradiz o relato de Tucidides na célebre “Oração Fúnebre” que teria sido pronunciada por Péricles ao final do primeiro ano da Guerra do Peloponeso – e as “Memoráveis” (sobre os ditos e feitos memoráveis de Sócrates) de Xenofonte. De qualquer modo não se pode deixar de ler:
422 Eurípedes: “As Suplicantes”
420? Tucídides: “História da Guerra dos Peloponesos e Atenienses”
400-347 [entre] Platão: “A República”
400-347 [entre] Platão: “O Político”
400-347 [entre] Platão: “As Leis
350-322 [entre] Aristóteles: “A Política”
322? Aristóteles (atribuída): “A Constituição de Atenas”
As bases teóricas da reinvenção da democracia pelos modernos
Depois de longo interregno, Althusius, Spinoza e Rousseau lançaram os fundamentos para a reinvenção da democracia pelos modernos: a ideia de política como vida simbiótica da comunidade, a ideia de liberdade como sentido da política e a ideia de democracia como regime político capaz de materializar o ideal de liberdade como autonomia. Não se pode, portanto, deixar de ler:
1603 Althusius: “Política”
1670 Spinoza: “Tratado Teológico-Político”
1677 Spinoza: “Tratado Político”
1754 Rousseau: “Discurso sobre a origem da desigualdade dos homens”
1762 Rousseau: “O contrato social”
A experimentação moderna de um pensamento realmente democrático
Sob forte influência de certo pensamento inovador francês, as ideias democráticas germinaram e se materializaram, todavia, na América. Sobre essa experimentação não se pode deixar de ler:
1776 Thomas Jefferson et allia: “Declaração de Independência dos Estados Unidos da América”
1787-1788 “Publios” (Alexander Hamilton, John Jay e James Madison): “O Federalista” (em especial Madison (1987) em um comentário sobre a Constituição dos Estados Unidos)
1789 “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”
1791 Thomas Paine: “Direitos do Homem”
1835 Tocqueville: “A Democracia na América”
1849 Thoreau: “Desobediência Civil”
1856 Tocqueville: “O Antigo Regime e a Revolução”
1859 Stuart Mill: “Sobre a Liberdade”
1861 Stuart Mill: “Sobre o Governo Representativo”
Dois esforços bem-sucedidos de identificação de aspectos do genos (ou do meme original) democrático
John Dewey e Hannah Arendt conseguiram identificar o que havia de original na ideia de democracia: a democracia como modo-de-vida comunitária, essencialmente cooperativo, local, na base da sociedade o no cotidiano do cidadão e a democracia como sentido da política (ou como a política propriamente dita). Cabe ler suas principais obras sobre o tema; pelo menos:
1927 Dewey: “O Público e seus problemas”
1929 Dewey: “Velho e novo individualismo”
1935 Dewey: “Liberalismo e ação social”
1937 Dewey: “A democracia é radical”
1939 Dewey: “Democracia criativa: a tarefa que temos pela frente”
1950 (c.) Hannah Arendt: “O que é a política?”
1951 Hannah Arendt: “As origens do totalitarismo”
1954 Hannah Arendt: “Que é liberdade”
1958 Hannah Arendt: “A condição humana”
1963 Hannah Arendt: “Sobre a revolução”
Interpretações e visões democráticas modernas
Restaram-nos as interpretações modernas, que repõem, em parte, o sentido original da democracia, como, entre outras, a de Claude Lefort e a de Cornelius Castoriadis, ou que reinventaram tal sentido, como a de Humberto Maturana. Cabe ler, um pouco mais do que isso:
1981 Claude Lefort: “A invenção democrática: os limites da dominação totalitária”
1986 Cornelius Castoriadis: “Sobre ‘O Político’ de Platão” (edição póstuma (1999) de seminários realizados em 1986)
1988 Humberto Maturana: “Linguagem, emoções e ética no fazer político”
1993 Humberto Maturana: “A democracia é uma obra de arte”
1993 Humberto Maturana (com Gerda Verden-Zöller) (1993): “Amar e brincar: fundamentos esquecidos do humano – do patriarcado à democracia”
1993 John Rawls: “O liberalismo político”
1993 Robert Putnam: “Para que a democracia funcione” (Comunidade e Democracia: a experiência da Itália moderna)
1994 Pierre Levy: “A inteligência coletiva”
1998 I. F. Stone: “O julgamento de Sócrates”
1999 Amartya Sen: “Democracia como um valor universal”
1999 Amartya Sen: “Desenvolvimento como liberdade”
A leitura dos textos acima não é exigida nem antes e nem durante o programa, mas eles constituem as referências básicas para uma compreensão abrangente do pensamento democrático. Por isso, eles serão mencionados frequentemente no decorrer do curso. E vivamente recomendados para um programa autodidático de capacitação democrática que será sugerido como continuidade do curso.
Escritor, palestrante e um dos mais originais pensadores políticos contemporâneos. Investiga há vinte anos a formação do capital social, a morfologia e a dinâmica da sociedade-em-rede. É o criador e um dos netweavers da Escola-de-Redes - uma rede de investigação dedicada às redes sociais e à criação e transferência de tecnologias de netweaving. Autor de várias dezenas de livros e textos sobre desenvolvimento local, capital social, democracia e redes sociais. Sua obra sobre democracia fundamenta-se em extensa pesquisa história e teórica, aliada a uma leitura original e aplicada ao contexto contemporâneo da sociedade-em-rede.