O que você precisa saber sobre redes | Módulo 24

Módulo 24

Atenção: você vai ler abaixo um texto provocativo, elaborado para estimular a conversação. Você não precisa concordar necessariamente com o conteúdo do texto provocativo e sim ficar atento às suas indagações. Todas as referências bibliográficas serão fornecidas oportunamente.

O que seria qualidade de uma rede? A qualidade de seus membros? Mas a rede é a coleção dos seus nodos ou a configuração da interação entre eles? Quem pensa em organizar uma rede, em geral quer escolher pessoas realmente interessadas no assunto e comprometidas com o propósito que imaginam que a organização deva ter. Pensa que deve haver dedicação e compromisso para a coisa "dar certo". Imagina então que isso pode ser conseguido se laços fortes forem estabelecidos.

Há aqui um desconhecimento da força dos laços fracos, que são os mais importantes para a emergência dos fenômenos interativos que caracterizam os mundos sociais altamente conectados.

O problema é que se a rede não for um ambiente favorável à emergência dos fenômenos interativos, ela não serve para nada. Neste caso, é melhor fazer mesmo uma organização regulada top down (como uma empresa piramidal) ou participativa (como um sindicato ou uma ONG).

Ora, a grande descoberta que acompanhou a geração dos Highly Connected Worlds foi que o comportamento das redes sociais não depende de conteúdos. Sua fenomenologia é interativa. E todas as formas de interação que foram descobertas pela nova ciência das redes revelaram a mesma coisa: nada a ver com conteúdos. Clustering, swarming, cloning, crunching – nenhuma dessas coisas tem a ver com conteúdo. Não têm a ver com ensinamento (replicação) e sim com aprendizagem (criação). Aprendizagem coletiva que reflete o metabolismo pelo qual os mundos sociais criam-se a si mesmos à medida que se desenvolvem.

Quando, a partir dessas descobertas, começamos a quebrar as cadeias, deixando as forças do aglomeramento livres para atuar, deixando o enxameamento agir, a imitação exercer o seu papel e os mundos se contraírem, os novos mundos altamente conectados começaram a vir à luz.

CLUSTERING

A primeira grande descoberta: tudo que interage clusteriza, independentemente do conteúdo, em função dos graus de distribuição e conectividade (ou interatividade) da rede social. Há muito já se pode mostrar teoricamente que quanto maior o grau de distribuição de uma rede social, mais provável será que duas pessoas que você conheça também se conheçam (essa é a raiz do fenômeno chamado clustering).

Em geral não se conhece todas as variáveis que estão presentes em cada processo particular, mas é observável que se formam clusters (aglomerados) em quaisquer redes, não apenas nas redes sociais. Insetos se aglomeram, doenças se aglomeram (e não apenas as contagiosas), empreendedores de um mesmo ramo de negócios tendem a se aglomerar (não é por acaso que encontramos lojas de tecidos, roupas, luminárias ou oficinas mecânicas concentradas em uma mesma rua ou quadra). E isso não depende, como ocorre em certas cidades planejadas (como Brasília) da localização forçada ou top down de setores (setor hospitalar, setor hoteleiro, setor automotivo etc.). É assim que, como mostrou Steven Johnson (2001), em Emergência: a vida integrada de formigas, cérebros, cidades e softwares, os vendedores de seda se clusterizam, há séculos, em determinada localidade de Florença. E voltam sempre para o mesmo lugar após as tão seguidas quanto inúteis tentativas de deslocá-los para outras regiões da cidade.

Os planejadores normativos – como construtores de pirâmides que são – não têm paciência para esperar a clusterização. Na verdade, como seu objetivo é construir organizações hierárquicas, eles não podem esperar a clusterização. A hierarquia exige desatalhamento, quer dizer, a supressão de atalhos entre clusters: só alguns caminhos podem ser válidos (e, por isso, só alguns são validados). Isso dificilmente ocorreria se a clusterização brotasse da dinâmica da rede. Essa é a razão pela qual os planejadores urbanos nunca construiriam uma Florença, tendo que se contentar em erigir suas capitais para algum deus hierárquico (como fez Amenófis IV para o deus Aton) ou arquitetar suas cidades-sede para o Estado, não para a sociedade (como aquela Brasília que foi inaugurada antes da convivência social dos brasilenses; depois estes últimos começaram a conformar a verdadeira Brasília modificando os estranhos caminhos traçados pelos planejadores). A diferença entre o zigurate de Uruk e o assentamento temporário do festival Burning Man revela quase tudo: poucos caminhos x múltiplos caminhos.

Ao articular uma organização em rede distribuída não é necessário pré-determinar quais serão os departamentos, aquelas caixinhas desenhadas nos organogramas. Estando claro, para os interagentes, qual é o propósito da iniciativa, basta deixar as forças do aglomeramento atuarem. Em pouco tempo (a depender da interatividade da rede), surgirão clusters agregando pessoas que se dedicarão às funções necessárias à realização daquele propósito: alguns se juntarão para cuidar da criação, outros para cuidar dos relacionamentos com os stakeholders, outros, ainda, da produção ou do delivery etc.

Até certos eventos planejados autonomamente por pessoas diferentes (que não se conhecem entre si) se aglomeram e isso é revelador de um metabolismo da rede, de uma dinâmica invisível que ocorre no espaço-tempo dos fluxos. Nada a ver com conteúdo. A partir do clustering outros fenômenos surpreendentes ocorrem em uma rede, como o swarming.

SWARMING

A segunda grande descoberta: tudo que interage pode enxamear. Swarming (ou swarm behavior) e suas variantes como herding e shoaling, não acontecem somente com insetos, formigas, abelhas, pássaros, quadrúpedes e peixes. Em termos genéricos esses movimentos coletivos (também chamados de flocking) ocorrem quando um grande número de entidades self-propelled interagem. Algum tipo de inteligência coletiva (swarm intelligence) está sempre envolvida nestes movimentos. Já se sabe que isso também ocorre com humanos, quando multidões se aglomeram (clustering) e “evoluem” sincronizadamente sem qualquer condução exercida por algum líder; ou quando muitas pessoas enxameiam e provocam grandes mobilizações sem convocação ou coordenação centralizada, a partir de estímulos que se propagam P2P, por contágio viral.

E não ocorre apenas como uma forma de conflito, como ficamos acostumados a pensar depois que Arquilla e Ronsfeld (2000) produziram para a Rand Corporation seu famoso paper “Swarming and the future of conflict”. Um exemplo conhecido dos efeitos surpreendentes do swarming – no caso, civil – foi a reação da sociedade espanhola aos atentados terroristas cometidos pela Al-Qaeda em 11 de Março de 2004. Escrevendo sobre isso, ainda preso as visões do swarming como netwar, David de Ugarte (2007), em O poder das redes, acerta porém quando diz:

“Como organizar, pois, ações em um mundo de redes distribuídas? Como se chega a um swarming civil? Em primeiro lugar, renunciando a organizar. Os movimentos surgem por auto-agregação espontânea, de tal forma que planificar o que se vai fazer, quem e quando o fará, não tem nenhum sentido, porque não saberemos o quê, até que o quem tenha atuado”.

O swarming (enxameamento) é uma forma de interação. Deixar o enxameamento agir significa ‘renunciar a organizar’, quer dizer, a disciplinar a interação.

O fenômeno acontece com mais rapidez em função direta dos graus de conectividade e de distribuição da rede. Em mundos altamente conectados tais movimentos tendem a irromper com mais frequência. E é por isso que eles surgem por emergência, não supervêm a partir de qualquer instância centralizada.

Assim, do que se trata é de deixar mesmo. As tentativas de provocar artificialmente swarmings, instrumentalizando o processo para derrotar um adversário, destruir um inimigo, disputar uma posição, vencer uma eleição ou vender mais produtos batendo a concorrência, em geral não têm dado certo. Todas elas acabam, contraditoriamente, fazendo aquilo que negam: tentando organizar a auto-organização.

E ainda bem que tais tentativas fracassam: do contrário viveríamos em mundos altamente centralizados por aqueles que possuíssem o segredo de como desencadear swarmings. De posse desse conhecimento (que logo seria trancado), um partido poderia eleger seus candidatos (e mantê-los no poder indefinidamente) ou uma empresa poderia reinar sozinha no seu ramo de negócio.

Nada a ver com conteúdo. Na sua intimidade, o processo de swarming pressupõe clustering e se propaga por meio de cloning.

CLONING

A terceira grande descoberta: a imitação também é uma das formas da interação e, desse ponto de vista, a imitação é uma clonagem. Poucos perceberam isso. Como pessoas – gholas sociais – todos somos clones, na medida em que somos culturalmente formados como réplicas variantes (embora únicas) de configurações das redes sociais onde estamos emaranhados.

O termo clone deriva da palavra grega κλώνος, (Klon, usada para designar "broto" ou "rebento", "tronco” ou “ramo") referindo-se ao processo pelo qual uma nova planta pode ser criada a partir de um galho. Mas é isso mesmo. A nova planta imita a velha. A vida imita a vida. A convivência imita a convivência. A pessoa imita o social.

Sem imitação não poderia haver ordem emergente nas sociedades humanas ou em qualquer coletivo de seres capazes de interagir. Sem imitação os cupins não conseguiriam construir seus cupinzeiros. Sem imitação, os pássaros não voariam em bando, configurando formas geométricas tão surpreendentes e fazendo aquelas evoluções fantásticas.

A imitação não é algo ruim, como começamos a pensar depois que surgiram os sistemas de trancamento do conhecimento (como, por exemplo, as leis de patentes e o direito autoral). A preocupação deslocou-se então da criação para a fraude, passando a ser um caso de polícia.

Mas não há aprendizagem sem imitação. Learn from your neighbours é a diretiva geral de auto-organização dos sistemas complexos e, portanto, de qualquer sistema capaz de aprender.

Quando imitamos, introduzimos variações. Nunca reproduzimos nada fielmente (isso seria impossível em qualquer mundo em que as condições são mutáveis e os imitadores são diferentes dos imitados). A propagação dessas variações se distribui de uma maneira estranha.

Você não imita uma-a-um ou um de cada vez. O que você imitou (e variou) vai ser imitado por outro (e ser também variado). Além disso, você imita vários ao mesmo tempo, combina e recombina modelos a ser imitados e essas recombinações também se propagam gerando novos padrões de adaptação emergentes.

Isso é o que chamamos aqui de cloning. Foi assim que nasceu a vida (o simbionte natural). É assim que está nascendo a convivência social “orgânica” (ou o simbionte social) nos Highly Connected Worlds.

Ao contrário do que se acreditou por tanto tempo, não há inovação sem imitação. E quanto mais imitação, mais inovação. Imitação não é propriamente repetição, reprodução assistida. Imitação é uma função dos emaranhados em que as coisas – inclusive os humanos – sempre estão.

Na verdade, nossos esforços educativos, ao querermos preparar as pessoas e orientá-las para que cumpram adequadamente uma função (em geral uma função que queremos que elas cumpram), são, em grande parte, tentativas de condicioná-las (ao que queremos que elas façam) e administrá-las (para que elas façam o que queremos do jeito que queremos). Se não estamos preocupados com comando-e-controle, tal esforço é quase sempre inútil. Bastaria deixar que elas aprendessem. Deixar-aprender é a solução interativista para a educação (que, como tal – como ‘a’ educação – é então abolida). E é também, sob certo ponto de vista, uma definição de democracia (no sentido “forte” do conceito).

Como naquelas experiências promovidas por Sugata Mitra (contadas por ele numa palestra do TED Global 2010: “The child-driven education”) com crianças de localidades pobres da Índia, que nunca haviam visto um computador e que aprenderam, elas mesmas, em grupo, não somente a usar a máquina e a rede, mas aprenderam a aprender em rede por meio da máquina, é preciso deixar as pessoas aprenderem na interação. Mitra não ensinava nada, simplesmente entregava computadores conectados às crianças e dizia: “ – Vejam aí o que vocês podem fazer, voltarei daqui a um mês”. Ao voltar verificava que elas haviam feito prodígios. Nessas experiências a aprendizagem fundamental era sempre a da interação (no grupo dos aprendentes). Mas isso vale para qualquer aprendizagem. A imitação não deve ser apenas tolerada senão estimulada (e se os chamados educadores soubessem disso incentivariam a cola nas suas provas ao invés de montar sistemas para vigiar e punir os transgressores: argh!).

Quando tentamos orientar as pessoas sobre o quê – e como, e quando, e onde – elas devem aprender, nós é que estamos, na verdade, tentando replicar, reproduzir borgs: queremos seres que repetem. Quando deixamos as pessoas imitarem umas as outras, não replicamos; pelo contrário, ensejamos a formação de gholas sociais. Como seres humanos – frutos de cloning – somos seres imitadores.

Nada a ver com conteúdo. Nos mundos altamente conectados o cloning tende a auto-organizar boa parte das coisas que nos esforçamos por organizar inventando complicados processos e métodos de gestão. Mesmo porque tudo isso vira lixo na medida em que os mundos começam a se contrair sob efeito de crunching.

CRUNCHING

A quarta grande descoberta: small is powerful. Essa talvez seja a mais surpreendente descoberta de todos os tempos. Em outras palavras, isso quer dizer que o social reinventa o poder. No lugar do poder de mandar nos outros, surge o poder de encorajá-los (e encorajar-se): empowerment!

Sim, é empowerfulness. Quando aumenta a interatividade é porque os graus de conectividade e distribuição da rede social aumentaram; ou, dizendo de outro modo, é porque os graus de separação diminuíram: o mundo social se contraiu (crunch). Steven Strogatz observou em 2008 que os graus de separação não estavam apenas diminuindo: eles estavam despencando (isso foi contado por Strogatz em seu depoimento no filme Connected: the Power of Six Degrees, da BBC). De uma perspectiva do fluxo, podemos afirmar que – sob o efeito desse amassamento (Small-World Phenomenon) – somos nós que estamos despencando... no abismo!

Nada a ver com conteúdo. Tudo que interage tende a se emaranhar mais e a se aproximar, diminuindo o tamanho social do mundo. Quanto menores os graus de separação do emaranhado em você vive como pessoa, mais empoderado por ele (por esse emaranhado) você será. Mais alternativas de futuro terá à sua disposição. Mais parcerias e simbioses poderá fazer para realizar qualquer coisa. Mais rico (de conexões) e mais poderoso (de empoderamento) você será, porque terá mais recursos (meios) e mais capacidade (potencialidade) de alterar disposições no espaço-tempo dos fluxos.

É o caso de dizer: bem, isso muda tudo.

Nos Highly Connected Worlds a contração (crunching) é acelerada. Em pouco tempo sua timeline fica tão caudalosa que você é arrastado pela correnteza.

Não adianta mais erigir muros para tentar se proteger da interação: como se sabe, a enxurrada, quando vem, leva tudo. Então você vai ter que aprender a viver em fluxo. Isso muda tudo porque muda a natureza do que chamávamos de normas e instituições, processos e rotinas, planos e agendas e, inclusive, propriedades (incluindo propriedades imobiliárias, como nossas casas – nossos refúgios contra as intempéries e nosso espaço privado, separado dos outros e protegido da interação com o outro-imprevisível). Uma vida em fluxo é uma vida nômade.

No passado temia-se que isso nos colocasse na dependência de dispositivos interativos móveis – e-readers e tablets – mochilas e naves. Quá! Tudo isso já é passado. Os dispositivos separados do corpo vão sendo substituídos por implantes conectores, as máquinas de ler livros e os computadores-comprimidos vão virando objetos tão jurássicos como aqueles velhos computadores-armários que rodavam fitas magnéticas e liam cartões perfurados. As mochilas vão ficando cada vez menores na medida em que não há muito para carregar (e carregar para onde?). As naves, entretanto, permanecem, mas são outra coisa.

Em um mundo contraído você precisa mesmo é da nuvem. Não de se conectar à alguma nuvem (criada por algum mainframe) para armazenar e acessar seus arquivos (quer dizer, o passado). Agora você é a nuvem. Agora você é a nave: como nas velhas catedrais góticas (pelo menos nas intenções dos pedreiros-livres que as construíram), você viaja sem sair do lugar (porque o lugar também passa a ser outra coisa). A nuvem é o emaranhado que viaja pelos interworlds junto com você. E esse emaranhado é o seu lugar. O seu lugar não é você (arrumando um jeito de ficar prevenido) contra o outro: o seu lugar é o outro.

Que tal?

  • Cris Kruel

    Muito louco isto tudo…

    – se rede não tem propósito, não temos como falar em qualidade
    – para ter uma rede basta apenas 3 membros

    – poucos membros tendem a permitir trocas mais rápidas
    – grandes redes distribuídas permitem muuuito mais interações
    – …

  • augustodefranco

    Pessoal, o programa não acabou. Ainda estamos recolhendo material para elaborar o book, levando em conta as interações de todos. Teremos, além disso, as referências bibliográficas. E o hangout amanhã às 19h. Vai ser na página: http://redes.org.br/25mitos-01-hangout/

  • augustodefranco

    Assistam o filme THE SQUARE (tem no Netflix e vale a pena assinar só para ver).

  • (o original disso era gigante, segue uma versão, opss.., editada)

    Segue um resumo da minha jornada até aqui. Se der tempo, volto nos comentários do módulos 12 ou 13 em diante até o 24. E no módulo 25 já existe um longo comentário, no qual defino o critério com base no qual entrei na conversa.

    Pontos positivos:
    1) noção de participação x interação: vários pontos no carma deste ciclo de estudo;
    2) noção de descentralização e distribuição: também muitos pontinhos no ranking;
    3) ideia de multiliderança, um grande achado;
    4) As quatro definições do módulo 24, que resumem o ponto de vista teórico;
    5) A oportunidade de participar do laboratório, o que me levou a escrever sobre assuntos que me interessam há tempos;
    6) ….assim que me lembrar de outra qualidade, volto e incluo.

    Pontos a considerar:
    O principal é a inversão de causa e efeito: toda a conversa tratada aqui se posiciona a partir da ideia de que o fluxo e seus padrões determinam o comportamento da rede.

    • Fernando Baptista

      Legal que você tenha percebido esses pontos todos, Cassiano. Sobre o seu ponto a considerar, é importante dizer que a ideia de causa e efeito é aqui irrelevante, pois estudos fenomenológicos se concentram principalmente nas relações entre os elementos, e não no que causa o que.

  • Catia Urbanetz

    muito joia esse texto, gostei!

  • Marcia Borges

    O que achei interessante nestes conceitos é que de alguma forma nós já pressentimos esses padrões, mesmo antes de estudá-los e termos mais consciência deles. Antes pareciam um ponto fora da curva e dava a impressão que tinhamos uma incompetência por não conseguir os controle almejados e entrava-ve num PDCA típico da engenharia que com a função de consertar algo errado. Acho que este ponto serve para absorvermos aspectos da realidade que não levamos em conta em função da “ordem e progresso” solicitada o tempo todo.

  • Professores, para resumir nossa conversa aqui, podemos afirmar então que para a Nova Ciência das Redes a única instância que interessa ou importa é o fluxo e a forma pela qual a interação ocorre, não a qualidade ou o conteúdo. É isso?

    • augustodefranco

      Aqui não há professores, Cassiano. Apenas pessoas conversando, alguns cumprindo o papel de netweavers, outros, outros. Você deve pensar com a sua própria cabeça. Não acredite no que alguém lhe diz – nem mesmo os que investigam a fenomenologia da interação e são pesquisadores da nova ciência das redes – se não se sintonizar com isso.

      • Poxa, Augusto, foi uma forma carinhosa de me dirigir ao grupo de organizadores; ademais, o que houve aqui foi, sim, um aprendizado. Eu pelo menos apreendi várias questões ao participar desse encontro. Preparei um resumo disso, vou publicar logo mais, teria outros pitacos a comentar nos módulos 14 em diante, mas não vai dar tempo: vou sair para o domingo, volto para o hangout às 19h. Porém, esse seu comentário me leva a fazer novas provocações, que vão a seguir.

        • augustodefranco

          O hangout foi transferido para quarta-feira, dia 11 de novembro de 2015 (para dar mais tempo das pessoas interagirem nos módulos finais). Você deve ter recebido o aviso no seu e-mail (confira aí, Cassiano). Minha observação foi carinhosa também. O maior elogio que há é dizer que uma pessoa pode pensar com sua própria cabeça e só aceitar aquilo com que se sintoniza. Acontece que a galera que promove esse troço aqui tem alergia do papel social do professor.

          • haha, é vero… Sobre a agenda nova, oxe, nem vi. O pior é que meu lap travou logo depois da postagem acima e perdi o que iria publicar aqui na sequência… Vou tentar reescrever, mas nunca sai do mesmo jeito… aff… 😐 OK, então, hgout na quarta, espero que dê para chegar junto. abs e bom domingo a todos.

      • O “a seguir” citado abaixo vai aqui:

        ***
        Veja que interessante: ao me avisar de que não devo aqui tratá-lo como professor, essa sua própria intervenção já é um processo de edição tal qual tenho me debatido ao longo de toda a conversa. Vc está literalmente direcionando a conversa, ou seja, editando a informação no sentido de preservar a conceituação original do curso, uma decisão soberana dos organizadores. Como comentei antes, assumir o rótulo de netweavers, como foi o papel de alguns na conversa, é, também, uma decisão de gatekeeping, que concebo como um ato de edição e direção: vcs decidiram montar essa rede com essa configuração e, o que é mais incrível, não para mim, fazem a defesa disso como se fosse o resultado de um padrão, quando o que ocorre é exatamente o contrário. Esse padrão é que é resultado da decisão primeira, lá atrás.

        Edição, escolha, gatekeeping: esse tipo de manifestação é o alicerce invisível que, ao meu ver, fundamenta a tal hierarquia, algo que julgo perfeitamente humano, inerente a todas as redes e totalmente justificável—ao invés de ser vista como uma aberração civilizatória como se discutiu em outros módulos. Essa hierarquia ditada pela edição é que possibilita criar a noção de direção, ao invés de mando e poder. Essa é a sutileza e a graça da conceituação sobre a qual construo meu enfoque acadêmico e mesmo profissional, quando isso é possível.

        Sinceramente, sem ser estudioso do assunto, creio que a ciência das redes terá um grande ganho quando ao menos considerar essa questão cognitiva editorial, ao invés de negá-la como fica claro nos 25 módulos. Ou então não entendi nada, o que não deve igualmente ser descartado 🙂

        Digo isso porque, ao percorrer os módulos, percebo que o conceito editorial, a ideia de gatekeeping que estou trazendo para a mesa, na verdade parece ser similar àquela constante universal que tanto incomodou nosso querido Eisntein: ela tem a capacidade de aglutinar tudo. Ou seja, é a tal matéria escura, cuja força gravitacional faz todo o modelo existir, mas que ninguém vê.

        Não?

        Como disse antes, gostaria de percorrer vários comentários e fazer provocações em que colocaria essa conceituação à prova, mas não vai dar tempo. Estou aberto, no entanto, a agendar um encontro com os interessados para consolidar nossa conversa online, uma vez que a comunicação verbal, presencial de preferência, é ainda comprovadamente mais eficaz do que aquela intermediada pela escrita. Poderia até mesmo ser uma ida a Campos do Jordão, onde entendi estar uma das sedes dos Nexters! 🙂 Fica a sugestão. Bom domingo a todos.

        abs.,
        c.

        • augustodefranco

          O fato de não assumirmos o papel de professores (cada qual escolhe como quer ser tratado) e sim de netweavers e conversadores, não implica hierarquia alguma. Isso é uma armadilha do pensamento de tipo clássico. Se eu lhe digo DESOBEDEÇA, você replica: então vou obedecer, por que vou desobedecer à sua orientação que me manda desobedecer. Não faz sentido, porque a desobediência existe em relação aos que querem que você obedeça, não aos que não querem. É a mesma coisa aqui, Cassiano. Professores são uma burocracia (e, portanto, uma hierarquia) do ensinamento. Aliás, toda hierarquia é professoral. Começou assim: era um poder (ou a imposição top down de um ordem ou princípio = arché, do sacerdote = hiereus) de intermediação centralizado num estamento que se reproduzia pela transmissão do ensinamento. Mas, para simplificar, vamos dizer que poder (sempre hierárquico) existe quando você pode mandar alguém fazer (ou deixar de fazer) alguma coisa contra sua vontade. Assim, influência não é poder. Liderança, quando não se prorroga como monoliderança, não é poder. Prestígio não é poder.

          Depois comento essa história de gatekeeping, mas de pronto já posso dizer que considero uma ideia instrumental que tenta tornar palatável, para as organizações hierárquicas, a noção de redes (distribuídas).

          É claro que este programa não é totalmente interativo e isso já foi conversado aqui em outra thread. Por isso ele é muito participativo (no sentido de que não é tão interativo quanto poderia): já havia um programa, já havia um ambiente de aprendizagem (uma plataforma) configurado e várias outras disposições pretéritas que não emergiram da interação. Mas nossa proposta, ao promover este programa, não era fazer uma rede distribuída e sim questionar algumas crenças sobre redes que estão disseminadas por aí. É um programa sobre redes e não uma proposta de articular uma rede específica. Mesmo assim, como redes sociais são pessoas interagindo, redes se formam aqui.

          • Vejo hierarquia de uma forma bem mais suave. Minha definiçào é classificatória. Portanto, concordamos aqui: todo poder é hierárquico. Mas acrescento: nem toda hierarquia é uma expressão de poder, pode ser uma simples priorização das infos percebidas. Claro que não tenho seu conhecimento histórico, talvez eu esteja atribuindo à palavra uma leitura branda demais: há um complemento disso numa resposta recente ao Giovanni.

        • Fernando Baptista

          Cassiano, acompanhando os seus comentários nos últimos dias, minha impressão é que você realmente entendeu pouco… talvez porque esteve mais preocupado em provar que a ideia de gatekeeping é melhor que todas as outras do que com a compreensão dos termos, ideias e conceitos aqui discutidos, assim como suas abrangências. Mas essa é só minha impressão.

          • Fernando, vc tem toda a razão! Realmente, não entendi vários textos a partir do módulo 13 até o 23. Em muitos casos soam como odes poéticas, mas não me dizem nada, tal qual um aforismo de Rousseau, hoje.

            Uma teoria serve para nos ajudar a entender uma dada realidade e nos guiar. Vamos a um exemplo: como o conjunto cita a praça Tahrir em dois um três momentos, passa-me a impressão de que a teorização defendida aqui embazou aquela falsa ideia de que a tal Primavera Árabe foi uma manifestação de Fbook, o prenúncio de uma nova era. Esse papinho rolou forte no Brasil e no mundo. Só que não. Poucos entenderam naquele momento que a mão que balançava aquele berço nunca foi o enxameamento via internet. O caldeirão que estava por trás das várias forças políticas apenas usava a rede para esquentar o caldo que faz um Kadafi parecer hoje uma criança inocente.

            Quanto à sua impressão, desculpe-me, não procede. Quem começa tentando convencer sobre algo sào os módulos aqui, basta ler as conclusões acima. Quem chama para para a conversa é a proposta aqui. Meu exercício foi tentar convencer a mim mesmo de que os conceitos expostos param em pé, aplicando-os na nossa própria argumentação. Alguns conceitos propostos aqui fizeram todo o sentido, outros não. Já tenho um resumo disso pronto desde domingo, como mudou o hangout, ainda não publiquei.

            Para dizer porque algo nào para em pé, preciso expor meus motivos. A não ser que por simples “acoplamento estruturado” essa exposição seja transferida aos que estão aqui, uma coisa, assim, meio Avatar. Não me parece o caso. Minha sugestão: não me leia, ora. Corte a interação pela raiz. Detalhe: essa decisão é sua.

          • augustodefranco

            Onde você leu que o swarming de 11 de fevereiro de 2011 foi resultado do uso do Facebook, Cassiano? Acho que você está conversando com os interlocutores errados. Mesmo que o Facebook tivesse sido usado o meio (a mídia) não determina a fenomenologia (no caso, o enxameamento, que ocorreu também em março de 2004 na Espanha, quando não havia Facebook e a coisa se espalhou por SMS e por e-mail). Pessoas vêm estudando isso – inclusive eu – há uma década. Não fazemos parte da turma que trava “papinhos no Facebook”. Pelo menos tente conhecer os pontos de vista das pessoas com quem você está conversando, do contrário você desqualifica a conversação. Essas opiniões não são só minhas e de meus amigos pesquisadores de redes, como Pierre Levy e Manuel Castells. Hoje elas são compartilhadas por boa parte dos cientistas que se dedicam ao tema. Pelo menos 20 swarmings foram já mapeados neste século (a começar da Espanha, passando pelo 17-20J no Brasil, pela Turquia, pela Venezuela e por Hong Kong no ano passado).

            Os textos colocados aqui – vou repetir mais uma vez – são apenas provocações. Você não deve aceitá-los se não concordar com eles. Mas nosso espírito aqui deve ser conversar, não travar debates. Noto em você uma certa vibe do debate, uma coisa assim meio século 20 de militante participativo. Eu, pelo menos, estou fora desse tipo de coisa. Tenho o maior prazer em conversar, descobrir junto, mas não digladiar, nem desqualificar o interlocutor.

          • Li na imprensa, Augusto. O convite foi para interagir e reagir frente às “provocações”. Mas isso deve ser feito de um jeito específico. Então tá.

          • augustodefranco

            Você pode “reagir” como quiser, Cassiano. Prefiro manter a palavra que foi usada: “interagir”. Há uma diferença semântica. Apenas declarei que “eu, pelo menos” tenho mais prazer em conversar (que significa “dar voltas juntos”) do que em esgrimir argumentos (um de cada lado reagindo ao que diz o outro). Está tudo bem. Cada qual deve seguir suas preferências.

          • Mas Augusto as provocações publicadas aqui a mim esgrimem argumentos igualmente! Retomando essa info da “revolução de Fb”, na época da tal Primavera Árabe houve uma conversa nesse sentido, e os textos aqui parecem dar suporte àquelas suposições, pois o discurso é muito próximo.

            Por que meus argumentos são esgrimas e os argumentos das provocações são flores interativas? Não estou degladiando, tentei entender os pontos de vista do meu jeito, o convite foi para interagir, então fui ao exercício! Os módulos que citei dizem a mim tanto quanto Levy dizia quando vislumbrava “códigos informáticos que são eventualmente traduzidos por um computador em sinais alfabéticos”. O que isso significa?? Bem, as pessoas seguiram usando o “virtual” sem se preocuparem com esse detalhe.

            Ao defender o que para mim significava uma platitude, Levy deixava de perceber que o verdadeiro virtual somos nós. O grito de gol que ecoa pelo país é a verdadeira rede, independentemente de como cada um chegou naquele instante informativo, via tevê, rádio ou internet. Ao não perceber isso, a teorização dele distanciava as pessoas do entendimento da tal virtualidade, induzindo ao erro. Afinal, a função de uma teoria é ajudar a ler a realidade ou uma suposta verdade. (segue…)

          • Provocação gera provocação, qual o problema? Uma coisa é identificar que os 20 mapeamentos de swarmings contêm características similares. Outra é afirmar que essas características conduzem a que o resultado aconteça, sem considerar as pessoas e seus motivos, as forças reais responsáveis por esse fluxo. Ao defender como se defendeu aqui que o conteúdo não importa, toma-se o efeito (o padrão da interaçào) pela causa (a decisão política das forças sociais, fruto da decisão somada de cada um).

            O resultado é aquela info superficial citada acima: a internet foi vista como a grande causadora de uma manifestação. Estarão as teorias aqui construindo o 26o. mito? O fato é que muito jornalista, supercifial por natureza, comprou essa leitura de uma “revolução de Facebook”, o que nunca foi verdade, ao menos da forma como se vendeu.

          • augustodefranco

            Aqui não falamos nada de confundir a mídia social com a rede social, Cassiano. Você está lendo realmente o que escrevi (por exemplo, que o primeiro swarming deste século não se disseminou pela internet e sim pelo torpedo celular e que a conquista do Oeste nos USA foi um swarming em linhas temporais estendidas)? Tire um tempinho aí e assista o filme THE SQUARE (de preferência várias vezes). Tem no Netflix (e vale a pena assinar só para ver).

          • Pra finalizar a conversa, vou propor um exercício mais radical aqui: posso apagar todos as minhas intervenções até quarta-feira. Pronto: a interação deixará de existir? Ela terá existência se ficar confinada aos becapes internos de vcs?

            Essas interações deixarão de existir para a Fátima, o Yamada, o Giovanni? Ou a interação permanecerá, mesmo fora da rede, real apenas na lembrança de cada um, até sumir como num sonho? E quanto aos “olheiros”?? Dos mais de 100 que potencialmente podem acessar essa conversa, o que ficará será o padrão dessa interação ou apenas a percepção que cada um terá dessas conversas?

            Até quarta-feira, não restará interação alguma, exceto por esta mensagem aqui e o meu resumo. Se a interação desaparece deste ambiente, a Nova Ciência das Redes concluirá que essa conversa não existiu, pois seu registro desaparecerá das análises? Ou o mapeamento identificará uma mancha no padrão e ficará satisfeito por isso, mesmo que o registro que originou essa mancha tenha sumido desta interface?? Essa mancha será considerada positiva? Negativa? Por quê? Será descartada? Por quê?

            ***
            Bem, cabe deixar aqui a pergunta que originou toda essa confusão recente, a partir de eu ter usado lá atrás a palavra “professores”. Essa palavra foi contestada ao limite, mas a pergunta em si deixou de ser respondida.

            Volto a ela então, e deixo aqui minha dúvida final, um pouco mais detalhada, para encerrar minha interação na conversa: podemos concluir que para a Nova Ciência das Redes a instância que interessa ou importa é o fluxo e o padrão pela qual a interação ocorre, não a qualidade ou o conteúdo que cada pessoa traz para a conversa, sejam essas instâncias últimas boas, ruins, contemporâneas, antiquadas, suaves, intensas ou o que for?

          • augustodefranco

            Você ainda não entendeu, Cassiano. A rede não é a internet. A rede é social, não é uma tecnologia: é um padrão de organização.

            Quanto à sua pergunta, a minha resposta é: sim. A fenomenologia da interação não depende do conteúdo (ainda que o conteúdo seja importante para os sujeitos, ele não explica o comportamento coletivo), mas de outras características (como a frequência, a recorrência, as circunstância em que se dão os acoplamentos et coetera). Por isso que, quando ocorre um swarming social, é inútil ficar perguntando qual é a pauta ou quem convocou: não sei se pulo muitas passagens para ir direto ao ponto, mas veja a imagem abaixo:

          • Fernando Baptista

            Diante das constantes insinuações do Cassiano de que os co-criadores desse programa desconsideram decisões pessoais em suas analises, acho oportuno reproduzir aqui um trecho de uma thread lá do módulo 11, um trecho de conversa envolvendo a mim e ao Augusto que começou com algumas instigantes perguntas da Fatima. É oportuno porque mostra, entre outras coisas, que essas insinuações do Cassiano são falsas oposições, ou seja, são oposições a algo que ninguém nunca disse ou demonstrou pensar, mas colocadas (através de uma operação de distorção) de modo a dar a entender ou insinuar que a pessoa disse ou pensa isso ao que se está opondo (mais abaixo vou falar das falsas oposições desde o ponto de vista da análise de dinâmicas de rede). Segue o trecho da thread:

            Fernando Baptista – 4 dias atrás: Fatima, relendo aqui essa thread, e pensando lá nas suas perguntas iniciais, minha impressão é que a rede (ou seja, a topologia) é o que estabelece essa influência indireta entre a esfera do comportamento individual e do comportamento coletivo. Porque o comportamento individual pode impactar a topologia (deixando a rede mais ou menos distribuida), o que impacta então o comportamento coletivo… e os fenômenos coletivos também podem impactar a topologia, o que por sua vez limita ou influencia o comportamento individual. Augusto, o que você acha disso?

            Marcia Borges – 4 dias atrás:

            Depois de acompanhar os threads deste modulo para mim isto é o que mais faz sentido.

            augustodefranco – 4 dias atrás:

            Eu acho bom!

            augustodefranco – 4 dias atrás:

            Mas acrescento que o comportamento individual nunca é individual a não ser no sentido de que cada pessoa espelha o seu mundo social (o multiverso de suas relações) de modo unique. Então, se algum nodo da rede tem um comportamento que possa ser considerado individual, ele já é resultado de uma fluição que o atravessou. De sorte que não se pode pensar a partir da dicotomia (e muito menos da complementaridade) indivíduo-rede.

            Fernando Baptista – 4 dias atrás:

            Sim, seria então comportamento pessoal ao invés de comportamento individual, não é? Assim como as decisões também seriam pessoais, a esfera da liberdade humana. Considerando então que pessoas seriam singularidades emergentes no tecido da rede, e que possuem uma esfera de liberdade (exercida por meio das decisões pessoais), e aplicando a mesma ideia a fenômenos coletivos, daria pra pensar que fenômenos coletivos também possuem uma esfera de liberdade e “tomam decisões”?

            augustodefranco – 4 dias atrás:

            Penso que em redes de humanos, quer dizer, redes sociais, quem “toma decisões” é sempre a pessoa, Fernando. A questão é saber o que é a pessoa.

            Acho interessante reler essa thread desde o início, porque ela é um bom exemplo de uma conversa com dinâmica interativa, na qual pessoas co-constroem conhecimento a partir da busca de complementaridade mutua entre suas contribuições e de divergências baseadas em reais oposições (fundamentadas no que realmente foi expresso e sem a intenção de desqualificar o interlocutor)… dessa dinâmica emerge algo que podemos pensar como inteligência coletiva.

            Por outro lado, as falsas oposições são artifícios típicos de dinâmicas participativas, nas quais o que está em jogo não é propriamente a clarificação de entendimentos, mas algo como “ganhar a discussão” diante de uma platéia, sobretudo através da desqualificação do outro e de seus argumentos (sejam lá quais forem eles)… elas confundem e normalmente terminam em caminhos sem saída. Do ponto de vista da psicodinâmica de grupos, as falsas oposições são vistas como um tipo de tentativa parasitária de ganho de relevância social dentro do grupo. Parasitária porque quem as aplica estaria “parasitando a energia da conversa” na tentativa de ganho de significância social, ao mesmo tempo em que não contribui muito para enriquecer a conversa.

            Como o ambiente desse programa foi configurado de modo a incluir ao mesmo tempo elementos interativos e participativos (o que já foi afirmado, reconhecido e explicado pelos co-criadores por várias vezes nos posts dos módulos anteriores), é possível notar as duas dinâmicas acontecendo concomitantemente, o que na verdade facilita a comparação e a percepção das diferenças entre elas. Do ponto de vista da análise de redes, uma dinâmica participativa é caracterizada por um menor grau de distribuição, e a utilização de falsas oposições é uma prática que conduz a bloqueios de fluxos de co-construção de entendimentos e assim à redução da distribuição e da interatividade.

            Minha intenção com esse post não é demonizar ou desqualificar a atitude do Cassiano ou de qualquer outra pessoa aqui (na verdade acho que nesse programa ela está até sendo muito útil pra ajudar a abordar e clarificar essas questões), mas chamar a atenção para o impacto que a configuração de um ambiente pode ter no comportamento das pessoas. Quando pessoas percebem ambientes como participativos, a tendência é que elas assumam posturas de preparação para o conflito e o combate. E em ambientes majoritariamente participativos também nunca veremos fenômenos típicos da alta interatividade em redes distribuídas, como os abordados no texto deste módulo.

  • Fatima Melca

    Eh, parece que é isso. Pelo menos por hora. É assim porque é. Me lembro da virtualização que passa a atualização e assim vai.